Carta à Comunidade Científica

Em Reunião Extraordinária do Fórum Nacional de Coordenadores da Universidade Aberta do Brasil - UAB, realizada nos dias 16 e 17 de outubro de 2017, na Universidade Federal do Rio Grande - FURG - a exemplo das demais instituições públicas de diversos campos de atuação, que já se manifestaram, e, inspirados na fala desses atores sociais, nós, representantes das instituições públicas, pertencentes ao sistema UAB, posicionamo-nos da forma que se segue:

Que sociedade estamos construindo? A resposta a essa indagação é muito emblemática, pois, o atual contexto social, político e jurídico nos inclina a acreditar que tempos difíceis tendem a se adensar, se não houver uma reação sistemática dos segmentos socialmente organizados, com vistas a sua reversão

Recentemente, fomos surpreendidos com prisões arbitrárias de servidores públicos da Universidade Federal de Santa Catarina, que culminaram com o suicídio do seu Reitor afastado, Professor de Direito Luiz Carlos Cancellier. Em sua última mensagem, esse Reitor afirmou: “Minha morte foi decretada no dia do meu afastamento da universidade". Devemos compreender essa mensagem como um alerta à ameaça que a sociedade tem enfrentado nos tempos atuais. Não foi um simples afastamento, porém, sim, uma política deliberada de intimidação, de decretação de culpa antes de se proceder a julgamento, de linchamento pela mídia, de uma campanha de desvalorização do setor público em geral e, em particular, da Universidade e dos servidores públicos.

Não vamos entrar na discussão dos procedimentos legais. Outros atores com mais conhecimento do campo jurídico já se pronunciaram acerca desse fato. No entanto, é preciso que se reflitam sobre o que essas ações representam. E, para isso, iremos nos ater ao que estudamos, conhecemos e construímos ao longo desses anos.

O Sistema UAB foi criado, há mais de 10 anos e, desde então, tem auxiliado às intuições públicas de ensino superior brasileiras, na sua missão maior de expandir a formação para todo país, propiciando condições de acesso a esse nível de ensino à população brasileira. Não existe bem maior do que o conhecimento, podemos dizer que ele é nossa maior expressão de liberdade. Ao longo de sua existência a UAB já formou mais de 180 mil profissionais. A contribuição da universidade pública e gratuita nesse processo é imensurável e inquestionável.

O atual clima que se instalou no país traz consequências diretas para além da política imediata, para além do jogo do poder e das disputas eleitorais. O clima de ódio, de julgamentos prévios, de
compreensões sobre ética e moral equivocadas, tem impacto na educação, na formação e, sobretudo, nas ações da população brasileira, que já sofre com o desmonte das políticas públicas e sociais.

É hora de dar um basta. Não aceitamos condenações a priori, conduções coercitivas de cidadãos, perseguições injustificadas. Que sociedade estamos construindo? Que valores estamos reafirmando com essas ações? Estamos a caminho de uma sociedade doente, não somente como metáfora, mas como uma avaliação objetiva dos fatos. O Reitor Luiz Carlos Cancellier foi uma vítima, “a ponta do iceberg” das consequências desse modelo intolerante, preconceituoso e agressivo de tratar os cidadãos brasileiros que não se moldam, que lutam e que defendem uma visão de sociedade realmente democrática.

Como bem frisou o Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e Professor da Universidade Federal desse Estado, na Sessão Solene Fúnebre do Conselho Universitário, Lélio Rosa
de Andrade, o Reitor Luiz Carlos Cancellier deu sua última lição antes de morrer, pois ” em momentos de histeria coletiva, só a tragédia pode chamar a atenção”.

Em razão disto, o Fórum Nacional de Coordenadores UAB manifesta sua indignação e repúdio a essa forma de tratar o cidadão brasileiro e ao projeto implícito de destruição da universidade pública. Por isto, solidariza-se com a Universidade Federal de Santa Catarina, em especial com os profissionais que atuam na UAB e também com todos os dirigentes públicos das instituições de ensino e de pesquisa ameaçadas, não só pelo corte nos seus orçamentos, mas por julgamentos prévios, decorrentes de notícias falsas, e por intimidações e agressões pessoais. É hora de um posicionamento firme e união de todos que acreditam na democracia real, na igualdade de direitos, no ensino e na ciência como formas de contribuir para uma sociedade mais justa e democrática.

A luta pela democracia não tem descanso e não se intimida!